quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Comentários que Emocionam

Antes de mais nada, queria pedir desculpas para todos aqueles que estavam seguindo o meu blog e não encontraram mais atualizações. Como já disse antes e repito, muitas vezes tenho a impressão de que estou escrevendo só para mim. Fico com a memória e não sento e escrevo mais com tanta freqüência, o que eu acho uma vergonha, uma vergonha do tamanho do mundo depois de ler tantos comentários que me emocionaram muito! 
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Não tinha idéia de que tantas pessoas estavam passando por aqui...Seja o próprio paciente que está se recuperando da SGB ou familiares que estão pesquisando sobre o assunto e se depararam com o meu blog...Por isso resolvi dar uma carinha mais alegre para o blog, mudando o design e resolvi responder em um único post, algumas pessoas que ainda tinham dúvidas sobre como me recuperei.
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Gente, hoje estou bem, ainda morando em Dublin, na Irlanda, rezando todos os dias para que a Síndrome nunca volte para a minha vida e lutando para conseguir o sorriso "antes SGB" de volta. Domingo passado acordei e lembrei do blog, e resolvi dar uma olhada nele assim que sai da cama. Meu namorado ficou até assustado, porque ele acordou e me viu chorando na frente do computador. Fiquei muito feliz de saber que tenho ajudado pessoas com a Síndrome e os depoimentos emocionaram mesmo.
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Como muitas pessoas não deixaram e-mail, resolvi responder por aqui algumas perguntas e contar um pouco mais sobre como estou hoje, já que o blog está andando devagarzinho!
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(Joice, uma grande amiga que conheci em Dublin)
"Sorriso de Monalisa!!! olha que chic! Deixando as brincadeiras de lado, fique com o lado leve da historia, vc logo vai sorrir com todos os dentoes pra fora... a gente nunca sabe totalmente os misterios da vida, eh ai que entra a Feh.. obrigada por eu fazer parte da sua caminhada .. bjssssssssssss Te Amo muito!!!! Joice"

Para quem não sorri ainda do jeito que sorria antes, lembre-se da Monalisa...pense que temos aquele rosto misterioso, aquele sorriso pequeno, mas que nossa história pode trazer muito mais alegria do que um sorriso cheio de dentes! Sei que é difícil e ainda não consegui recuperar todos os movimentos do rosto, mas muito lentamente sinto que estou melhorando...E a paciência agora faz uma parte enorme nas nossas vidas!
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(Mah)

"Oi Cintia!

Estou pensando em fazer um intercâmbio na Europa e busco por informações em blogs, mas o foco mudou quando vi o post sobre a SGB, pois sou fisioterapeuta ortopédica, mas nos estágios atendi alguns pacientes com doenças neuromusculares (algumas progressivas e terminais outras progressivas, mas com cura como a sua). Achei emocionante ler tudo que postou, pois foi possível saber como um paciente se sente com detalhes. Vc disse que sua recuperação foi rápida, por isso quero lhe dar os parabéns, pois vc foi a maior responsável por ela, mesmo com tanta dor, medo e outros sentimentos mais particulares seus. Vc ainda não terminou de nos contar, mas provavelmente fez fisioterapia. Nós fazemos da melhor forma nosso trabalho, mas a recuperação de um paciente que tem sede de reabilitação é muito mais rápida. Muita saúde e felicidades.
Um abraço."


Mah, fiz fisioterapia desde que estava na UTI em Curitiba. Quando fui para o quarto os exercícios se intensificaram e sofri muito. Sofri por dor e por medo de não conseguir nunca mais levantar. Não acreditava que aqueles movimentos poderiam um dia voltar a serem feitos por mim, só por mim...E até sair do hospital ainda não conseguia mexer nada sozinha, o que me deixava meio desacreditada... Desmaiei de dor quando me sentaram pela primeira vez. Estava tudo tão atrofiado e sem o acompanhamento de uma fisioterapeuta ou médico, as enfermeiras uma dia tentaram me sentar de uma maneira tão rápida que a dor foi tanta e terrivelmente insuportável, que não aguentei e desmaiei de dor. Mas aquele foi o começo para poder usar a cadeira de rodas para sair do quarto algumas vezes e até para tomar banho no banheiro, e não mais em cima da cama. Em casa também tive uma fisioterapeuta incrível, que me ajudou muito e junto comigo foi a responsável pela volta dos meus movimentos. Também com a fisioterapia meu intestino voltou a funcionar um pouco melhor e com massagens Reiki, relaxava depois de cada sessão e dormia em paz sem dores. Fiz fisio na piscina e em um mês eu já estava andando novamente. Foi muito rápido!!
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(Ricardo)

"Cíntia...

Sou Engenheiro Civil, tenho 40 anos, trabalho em obras pela Amazônia. Sempre fui saudável, daqueles que nunca nem tinha pisado num hospital. Consegui Diagnóstico e Tratamento em Goiânia/GO. Sou um sobrevivente da SGB. Sofri muito com diagnósticos errados e o desconhecimento da própria classe médica em Geral.Fui oficial do exército e tenho porte físico acima da média dos brasileiros. Fui literalmente derrubado em uma semana. Perdi a locomoção e as forças.....juntamente com a dignidade...pois de uma hora para outra a doença te incapacita totalmente. Perdi 12 Kg em 30 dias. Sao 400 gramas por dia !!!! No dia de meu embarque para Goiânia tive uma crise no Aeroporto de Porto Velho e embarquei já numa cadeira de rodas. As crises de falta de ar estavam frequentes ! Hoje faz 01 ano. Estou recuperado e também superei os 6 meses sem uma cervejinha ! Minha sequela se restringe aos movimentos finos das mãos, que ainda tremem e formigam....mas isso é contornável. Tenho conhecido muita gente acometida com a SGB, inclusive indo a óbito. Dizem que uma maior incidência da doença está sendo observada nos últimos anos, provavelmente relacionada ao excesso de vacinação a que nos submetemos, já que se trata de uma doença autoimune. Felicidades e enjoy your life !"


Ricardo, muito bom saber que já faz mais de um ano e que já está recuperado. Essas sequelas são mínimas comparadas com o que passamos. Como você disse, a dignidade vai embora mesmo com a SGB, o que acaba com a mente de adultos independentes e saudáveis antes de serem derrubados pela Síndrome. Eu emagreci só quando fui para casa e também foram embora mais de 10kgs. No hospital mantive o peso talvez por causa da alimentação através da sonda, mas assim que fui para casa não consegui comer mais do que 3 colheres de sopa de papinha para bebês que minha mãe fazia, no caso "papinha para Cintia", e comecei a perder muito peso. Minha sequela só se restringe ao rosto, nunca mais senti fraqueza em nenhuma parte do meu corpo e quase tenho um infarto toda vez que sinto minha perna formigar por causa da má postura. Acho que todo mundo que se recuperou da síndrome deve sentir esse medo eterno de que "ela" pode voltar! Mas fico muito feliz de saber que está bem. Felicidades para você também! *Não tomei as vacinas para a H1N1, mesmo no auge da gripe suína. Tive medo e depois de ver no Jornal Nacional um caso de Guillain-Barre por causa da vacina, é que não tomei mesmo. Voltei para a Irlanda sem tomar vacinas e ainda tenho muito medo de tomar qualquer uma delas.
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(Gisele)
"OI!Meu nome é Gisele, em 25set11, fui diagnosticada com a sindrome e a pouco mais de 12 meses estou em tratamento.Ler seus depoimentos foi super importante pra mim, pois estou passando por todo esse processo e é terrível!Os altos e baixos, a depressão, enfim, saber de certa forma que esses sentimentos todos são "normais" conforta um pouco. Ao tentar conversar, as pessoas apenas dizem pra gente ter paciência, cobram atitudes, reações, mas não conseguem entender o quanto esse processo é doloroso!Sou policial militar e estar afastada das minhas atividades, da minha vida normal, sei lá, é tudo tão difícil!Encontrei um conforto no teatro, parece até engraçado, mas lá me sinto melhor, apesar de todas as limitações!Parabêns pela vitória pela coragem de expor suas dores, e saiba que seus depoimentos me ajudam a seguir. Sei que recebi um presente de Deus, uma nova vida, mas é difícil começar do zero, reapreender tudo, ter limitações em um mundo tão preconceituoso!Muito obrigada, você não tem noção do bem que me fez!Parabêns guerreura!
Gisele Suminski"

Oi Gisele, fiquei muito emocionada com seu depoimento e achei o máximo você encontrar o conforto no teatro. Acho que temos sim que sair do nosso mundo pós Síndrome e dar a cara para o mundo lá fora, mesmo com todas as limitações que você falou, pois só assim tratamos o problema que está na nossa cabeça. A depressão bate forte, o medo e a baixa auto-estima chegam com tudo. Conviver com pessoas novas ajuda a mudar o foco, se distrair e ao invés de ficarmos nos perguntando o "Por que" das coisas, começamos a parar de questionar e passamos a agradecer a segunda vida que estamos ganhando. Cada visita que recebi foi uma grande ajuda, principalmente aqueles que conversavam comigo sobre assuntos nada ligados a SGB. Por algumas horas, sem perceber, as pessoas nos ajudam de uma forma imensa se não ficarem batendo na tecla da Síndrome, e tenho certeza de que no teatro você é mais uma, como todos os outros lá, e isso faz a maior diferença. A melhor coisa que fiz durante a minha recuperação, foi pedir para sair um sábado a noite. Minha mãe ajudou a me arrumar, fiz maquiagem, troquei de roupa, meu pai me colocou na cadeira de rodas e lá fui eu com eles em uma lanchonete da nossa cidade. O começo foi difícil, pois foi a primeira vez que tinha saído de casa, e todo mundo olhava para mim, mas estar ali , numa noite agradável, conversar com pessoas, escutar outras histórias, ver que a vida continua, ajudou bastante. Espero que você se recupere 100% também, e se passar por aqui e ver essa mensagem, deixe outra para a gente, assim também acompanhamos a sua história! Um super beijo!
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(Gelson)
"Ola,

Meu nome e Gelson Matos,tambem fui acometido por esta doenca,e por incrivel que pareca  hj faz 1 ano que eu sai do hospital,nao tive nem um tipo de parilisia no meu corpo,pois fui diagnosticado e  atendido muito rápidamente,apesar de quando aconteceu eu estar fora do País ,eu estava no PANAMA,eu comecei a ter diplopia,e nao consiguia andar em linha reta,voltando ao Brasil,rápidamente,fui atendido no INC em Curitiba,pelo D.r. Henry Saito,que foi pessoa que me salvou..
Tive que passat  por uma serie de baterías de exames  ( que diga-se de passagem me traumatizaram bastante  ),ate que finalmente o exame do LIQUOR apontou que eu tinha GUILAIN-BARRE,fiquei internado 6 dias tomando imogobulina,foi difícil mas ate entao estava tudo bem...
Pasmem,sai do hospital andando e falando normalmente,e uma semana depois e que o bicho comecou a pegar,comecei a perder a minha voz,e ate hoje,nao consigo articular  minha voz e nem escrever,Gostaria de saber como esta a sua voz hoje? Como e qual métodos vc usou?que tipo de profissional te ajudaram? 
Att 

Gelson Matos "

Oi Gelson! Nossa, sua história é totalmente inédita para mim. Sair bem do hospital depois do tratamento e só então começar a ter outros sintomas. Concordo que os exames para o diagnóstico da Síndrome são bem dolorosos e traumatizantes. A punção lombar assusta só pelo nome e pela explicação do procedimento...Senti muita dor durante a minha, como já relatei aqui no blog...E outro exame que foi bem desconfortável, foi um que o médico me dava choques em várias partes do meu corpo, para testar os estímulos. Também tomei 5 doses de imunoglobulina assim que o diagnóstico foi feito...Enfim, perdi minha voz antes de qualquer outro sintoma e antes mesmo de voltar a andar ela começou a ficar mais forte gradualmente durante as semanas que estava em casa. Lembro de tentar falar com minha fisioterapeuta e de repente minha voz saiu um pouco diferente. Parecia adolescente homem que entra na fase de trocar de voz...e assim foi indo até voltar ao normal. Não fiz nenhum exercício específico, pois foi voltando normalmente. Confesso que não lembro de ter tido nenhuma orientação no hospital a respeito da voz, quando tive alta, mas espero que você volte a falar e se expressar normalmente. Conta para a gente como você está e se está usando algum método para ajudar, pois podemos ajudar pessoas que também não recuperaram a voz normalmente como eu...Um grande abraço!
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(Charmeme)
"meu nome é charmene porto e ha 90 dias convivo com a sgb.
faz bem ler seu blog e ver que tudo o que sinto é normal.
o q vc considera recuperaçao rapida?
sonho em voltar a andar...
bj
charmene
casada mae de 3 filhos bancaria 43 anos e otimista"

Oi Charmeme, tudo bem?? Não deixe de sonhar e de acreditar, pois voltar a andar é muito possível! Eu não conseguia acreditar que um dia poderia me levantar da cama, ir ao banheiro, sentar sozinha e fazer todas as coisas normais que fazemos todos os dias...mas com muito esforço, paciência e fisioterapia, os movimentos foram voltando bem devagar, mas uma vez que consegui levantar, ninguém me segurou! Não tinha paciência para usar o andador, então só ficava segurando ele no ar, perto do chão, só para ter uma base caso caísse, e aproveitava para treinar os braços, e saía andando pela casa sempre que dava. Sentava e levantava do sofá, ia para o quarto, sentava na cama, e assim fui treinando. andava como uma criança que está dando os primeiros passos, ou como uma velhinha que estava dando os últimos. Algo desengonçado, mas que não me desanimou. A fisioterapia usando treinos de força, como empurrar o braço da fisioterapeuta com os pés ajudou muito a força voltar. Quando comecei a ter alguns movimentos, mas sem força ainda para levantar, ficava encolhendo e esticando a perna, mesmo deitada, só para praticar, e assim meus movimentos foram voltando. Mesmo depois que a fisio ia embora da minha casa, eu continuava a fazer exercícios com minha mãe. Saí do hospital em Janeiro, em Fevereiro, passei o Carnaval deitada ainda, mas em Março já tinha começado a dar meus primeiros passos. Então continue otimista, pois seus movimentos vão voltar! Força, força e muito esforço! Estou torcendo por você!
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(Anônimo)
"Olá! Minha filha também foi acometida por esta doença em janeiro deste ano, hoje está muito melhor, no entanto ainda não tem o seu sorriso antigo. Ainda hoje faz fisioterapia. Temos esperança que mais algum tempo ela volte a sorrir como antes. Obrigada por nos contar a sua experiência."

Olá! Eu tive a Síndrome em 2010...são 3 anos desde que saí do hospital e até hoje não tenho aquele mesmo sorriso, mas já melhorei e estou melhorando! Tenho certeza que aos poucos sua filha também vai se recuperar, ainda mais se está fazendo fisioterapia, o que é muito importante! Tem horas que nem lembro mais que não consigo sorrir "normalmente". Só quando vejo alguma foto com ângulo infeliz, ou quando estou tentando dar aquele sorrisão por conta de algo muito engraçado, que vejo um rosto meu "esquisito"...como se tivesse litros de botox na cara, mas já aprendi a conviver e aceitar! Um grande erro meu foi ter medo de sorrir por achar que meu rosto ficava estranho por estar paralisado, e assim fui ficando só no sorriso de Monalisa e consequentemente não treinava os músculos faciais...Então faça sua filha sorrir, rir, dar gargalhadas, assim ela vai treinar de forma natural e agradável!! Espero que possamos sorrir logo, logo, sua filha e eu! Grande beijo!!
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8. Transferência e nova UTI

A transferência para Curitiba foi mais tranquila do que imaginei. Desligaram todos os equipamentos que estavam em mim e lá fui eu para a UTI móvel ser levada para o Hospital Angelina Caron.
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Acho que o medo de todo mundo e principalmente o meu, era sentir muita dor durante a viagem, ou acontecer o pior durante o trajeto...Mas deu tudo certo e a equipe que me acompanhou me deixou tranquila e fizemos boa viagem.
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Não lembro o nome do médico que me acompanhou na ambulância, muito menos o do motorista, mas lembro muito bem do rosto do médico e da voz dos dois xingando muito o trânsito durante nossa viagem!! Foi uma adrenalina só estar ali deitada na maca, toda presa com cintos de segurança, escutar a sirene tocar e sentir o carro correr de uma tal maneira que só tinha visto em filmes.
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Minha mãe estava comigo o tempo todo, e assim fizemos uma viagem rápida de volta para o Paraná. Lembro que o médico me deu uma remédio para ajudar a dormir. Na minha cabeça eu não dormi 100%, mas quando chegamos em Curitiba ele perguntou se tinha relaxado, eu falei que não e ele afirmou que sim! Disse que eu tinha dormido...Bom...pelo jeito devo ter dormido mesmo...Porque para mim a viagem foi rápida, sem dor e poucas vezes escutava de longe o barulho da sirene, minha mãe conversando com eles ou rindo de cada xingamento por causa do trânsito, que infelizmente, não respeita ainda uma ambulância nas ruas e estradas do Brasil. 
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Outra lembrança que tenho bem clara dessa noite é quando eu falei para minha mãe que um dia queria voltar para o hospital de Camboriú, para agradecer todos os enfermeiros que cuidaram de mim na UTI. Denovo na minha cabeça eu falei bem claro e com essas palavras o recado para minha mãe, mas segundo ela eu falei que queria voltar para ver os "menininhos" e ela já se desesperou achando que eu estava vendo anjinhos e indo para o céu(hahaha). Desespero de mãe e deficiência vocal de filha! 
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Já dentro do hospital, gigantesco pelo que pude observar, mesmo deitada todo o tempo, fomos parar na emergência. Colocaram a maca meio de mau jeito dentro de um quarto que já tinha algumas (muitas) pessoas e durante todo o tempo minha mãe estava tentando falar com a enfermeira e com a médica de plantão, muito grossa por sinal, também chamada Cíntia, de que estava acontecendo algum engano.
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Minha mãe tentava explicar que era um caso raro, que um neurologista estava me esperando, que tínhamos acabado de chegar de Santa Catarina, e que era para eu ser transferida direto para a UTI. Durante o meio tempo, uma enfermeira já estava tirando os brincos que ainda estavam na minha orelha, e para o meu desespero, falou que eu precisaria trocar a sonda nasal. *Minha maca já estava posicionada de uma maneira para que eu passasse a noite por ali mesmo.
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Quando sai da UTI de Camboriú com o cano da sonda nasal ainda dentro de mim, senti um alívio por não precisar passar por toda aquela dor de novo para talvez colocar outra sonda . Mas no Angelina Caron, me explicaram que o risco de contaminação era grande, e por isso seria necessário fazer a troca...
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Enquanto a enfermeira tomava conta de mim, e eu sentia um caos a minha volta, minha mãe conseguiu resolver tudo, localizaram o neurologista que tinha aceitado meu caso e seria transferida para a UTI assim que possível.
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Diz minha mãe que foi impressionante a mudança de comportamento da tal Dr. Cíntia assim que soube do meu caso e que não era paciente da emergência. Enquanto TODOS têm o direito de serem tratados igualmente, naquela situação eu tive a infelicidade de encontrar uma médica arrogante e que não soube lidar com o desespero de uma mãe tentando se explicar. Pelo que eu me lembre, isso também faz parte do trabalho dela...mas...enfim...
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Já mais debilitada e totalmente perdida, sem saber o que estava acontecendo, começaram a empurrar a minha maca a caminho da UTI, e foi no corredor que tive um dos momentos mais emocionantes durante toda essa caminhada.
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Por coincidência, meu ex namorado, que também mora na Irlanda, estava de férias no Brasil, e naquele dia estava em Curitiba com sua família. Como a história se espalhou muito rápido, de alguma maneira eles souberam para que hospital eu estava sendo transferida em Curitiba e foram até lá para me ver. Eu não esperava, nem minha família sabia que eles estariam lá.
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Quando a maca parou e eu olhei para o lado e vi todos eles lá...O Reinaldo (meu ex), sua mãe, pai, irmã...foi muito, mas muito emocionante para mim. Até então as pessoas que tinham me visto naquela situação estavam entre meus pais, meu irmão e uma tia. Eu não tinha me dado conta da proporção do meu caso, de quantas pessoas estavam sabendo e de que o problema já não estava só nas mãos da minha família, mas que todos de alguma forma queriam ajudar.
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Sem nem ter tempo para pensar, eu comecei a chorar muito assim que os vi. De medo de estar morrendo, medo de estar vendo eles pela última vez, desconforto por estar na situação que estava, sem voz e expressões suficientes para demonstrar qualquer tipo de carinho...Enfim...Eu chorei...
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Ver nos olhos das pessoas o medo também não é uma tarefa muito fácil. Muitas vezes não é um olhar de dó, mas quem está do seu lado também sente medo e é muito fácil reconhecer isso. Olhar para eles foi doloroso, porque o susto, o medo estavam estampados em cada um. Mas lembro das palavras de conforto que eles falaram para mim, do carinho na cabeça e na mão, da oração... Sinto um carinho enorme por todos eles, e por mais que o choro tenha feito parte desse encontro, foi bom saber que outras pessoas além da minha família também estavam torcendo para mim.
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Depois do encontro que deve ter durado poucos minutos, fui direcionada para a UTI e cada vez mais sentia medo. Medo do desconhecido. Nova equipe médica, novos enfermeiros e um novo estágio da doença. O hospital parecia um labirinto, me empurravam por vários corredores, elevador, até que cheguei na UTI, GIGANTESCA...e me assustei mais.
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Um lugar enorme, com muitas camas, muitas pessoas sendo monitoradas e muitas pessoas trabalhando. Colocaram a minha cama logo perto da porta e ali fui apresentada para a enfermeira padrão e para os enfermeiros e auxiliares que estavam trabalhando naquele plantão. Trocaram minha sonda, minhas roupas e me colocaram no colchão mais desconfortável possível. Quem já ficou mais de 5 dias 24 horas por dia em cima de um colchão inflável sabe do que estou falando...
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A dor para colocar a sonda foi a mesma, na verdade ainda pior, porque tirar a primeira também foi bem desconfortável. Ligaram todos os aparelhos e me colocaram o mais rápido possível no oxigênio, pois o risco de parada respiratória ainda era alta naquele estágio da doença, por isso a UTI.
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A enfermeira conversou comigo e disse que o médico estaria lá a qualquer momento para me visitar. Tudo era novo e confuso e o que eu mais queria era sair daquele lugar, que para mim parecia o caos desde o primeiro momento e assim foi até o último.


segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

CÍNTIA EM TEMPO REAL

Altos e baixos...

Sexta passada recebi a ligação das minhas amigas de Dublin para poder ir na casa delas, montar a árvore de Natal e comer panetone que a Joice trouxe do Brasil. Foi uma noite agradabilíssima, me diverti muito, tiramos um milhão de fotos e quando fui postar algumas fotos no Facebook, enquanto ainda escutávamos música e tomávamos vinho, me deparei com essa foto:


É uma foto antiga, um ano antes de vir para a Irlanda, mas o que incomoda é olhar a aparência que eu tinha antes e a que eu tenho hoje... Olhei para as meninas, pois estávamos todas sentadas na sala e falei que o que me deixava mal era ver fotos como essa...Depois de mostrar a foto para elas tive uma mini crise de choro...
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Vamos ver se consigo me explicar:
Por mais que eu seja consciente de que tive uma recuperação recorde, muito mais rápida do que o normal, comparando com a gravidade do meu caso ( a síndrome me atacou de uma forma muito severa e perdi todos, TODOS os movimentos do meu corpo muito rápido), eu sou humana, sofri muito durante a recuperação e agora na parte final parece que perco o controle muitas das vezes e me preocupo com algo que pode parecer fútil, a aparência.
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É muito difícil pois quando o seu corpo muda e principalmente o rosto perde as expressões, a auto-estima vai para o chão, e foi exatamente o que aconteceu comigo. Eu sinto muita falta do meu sorriso, mas sorriso mesmo, igual a esse da foto, com dentinhos para fora!
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No começo da recuperação estava sempre muito focada em voltar a andar. Tive muito medo de ficar presa em uma cadeira de rodas pelo da resto da vida, mas quando comecei a ver a cada dia o progresso dos meus movimentos, comecei a ficar preocupada com as expressões do rosto que não voltavam.
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Além da dificuldade de me comunicar pois minha voz também estava muito fraca, eu não tinha expressão de dor e nem de felicidade. Não conseguia sorrir para demonstrar que estava bem e nem fazer cara feia para reclamar de alguma coisa, e essa situação foi se estendendo por meses e hoje, quase dois anos.
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A falta de expressões causou várias situações engraçadas e uma que nunca vou esquecer aconteceu quando já estava em casa e vi essa propaganda na tv pela primeira vez:



Quando a menininha pergunta para o pai por que o peixe não pisca o olho (hehe), eu achei muito, mas muito engraçado, mais até do que que realmente seja, mas dou risada até hoje. O problema é que na época não tinha voz e não movimentava nada no meu rosto, só abria e fechava a boca. Então quando tentei rir da propaganda um som muito feio saiu de mim, como se eu estivesse me afogando, uma mistura de falta de ar e soluço. Minha mãe veio correndo para o quarto e se desesperou. Ela achou que eu estava passando mal, que estava me afogando (uma das preocupações era eu me afogar em caso de vômito, por isso precisava estar acompanhada 24 horas, caso isso acontecesse alguém tinha que estar lá para virar meu corpo para o lado) e foi isso que ela fez! Ela gritava perguntando o que estava acontecendo, me virava de lado, e cada vez mais que via o desespero dela, mais engraçado eu achava e mais eu ria (daquele jeito feio). Foi desesperador para mim, pois não conseguia parar de rir e arrumar fôlego para tentar explicar a situação e acho que muito pior para minha mãe, por estar sempre assustada esperando o pior. Foram alguns minutos para eu me recuperar e explicar tudo. Quase apanhei. Damos muitas risadas até hoje por conta de situações como essa...
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Então dá para entender por que o rosto me afetou tanto? Recebia visitas e não conseguia sorrir...Até meu namorado, na época sabendo de tudo o que estava acontecendo, quando chegou no Brasil para me ver e fui buscá-lo no aeroporto, ficou chocado com a minha falta de reação. Dentro de mim eu estava transbordando felicidade, mas meu rosto não mostrava nada. Foi difícil para ele se acostumar com tudo aquilo.
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Eu não tenho fotos do hospital e nem da época da cadeira de rodas. A primeira foto que tirei depois da doença foi durante a festa que ganhei dos meus pais para comemorar minha recuperação e convidar todos aqueles que de uma maneira ou de outra ajudaram minha família. Então foi uma comemoração em dobro, meu aniversário, minha nova vida e o dia de rever todos os amigos, inclusive amigas de infância e faculdade (Oie Lorena, Rosane, Ana Carol e Cibele).
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Então hoje, antes de continuar com a história, resolvi escrever em como estou me sentindo, que tenho altos e baixos e que quando vejo uma foto com o sorrisão fico mal, mas quando vejo uma foto ainda paralisada agradeço de joelhos por estar aqui como estou.
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Então escolhi 10 momentos que mostram um pouco da minha evolução:
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1- Janeiro de 2010- 3 dias antes de ir para o Brasil, mal sabia que em 2 semanas estaria na UTI


2- Fevereiro 2010- Primeira foto tirada desde o diagnóstico da doença. Já estava andando, mas não tinha expressões faciais ainda. Também é possível ver como fiquei abatida e  magra depois de perder 10 kilos. Mas estava muito, muito feliz em rever minhas amigas depois de 3 anos.


3- Abril 2010 -Depois de sentir que o corpo estava 100%, foi a hora de viajar para São Paulo e rever todas as amigas de Dublin que coincidentemente estavam todas no Brasil! Não poderia perder a oportunidade. Foi emocionante, mas ainda sem expressões...


4- Em São Paulo mesmo, fiquei lá por um mês quase, foi quando comecei a ver os primeiros progressos no meu rosto, e quando voltei para casa já tinha uma expressão completamente diferente, mais leve! E também foi quando comecei a mudar o visual. Isso me ajudou muito no processo de aceitação, e desde então mudo meu cabelo quase todo mês!




5- Maio 2010- Estava bem melhor e pronta para as Bodas de Ouro dos meus avós!




6- Junho 2010- Me sentindo mais confiante e esperando eu ficar com um rosto mais simpático, foi a hora de voltar para Dublin.




7- Outubro 2010- A promessa que tinha feito de ficar 6 meses sem beber a partir do momento que eu me considerasse curada tinha acabado. Juntei a mulherada e fomos tomar a minha primeira cerveja da nova vida! Foi uma festa só, me diverti, me descontrolei e no fim até meus dentes começaram a aparecer!!! :)




8- Novembro de 2010- Minha primeira viagem depois de voltar para a Irlanda. Fomos comemorar a nossa amizade em Veneza!!



9- Janeiro de 2011- Um ano depois da doença, eu comemoro meu aniversário em Dublin e no Egito e com muita saúde! Mega evolução!! Pronta para mais 25, 35, 50 anos!




10- Dezembro 2011- O dia em que fiquei mal quando vi aquela foto lá do começo do post... Mas escrevendo, escolhendo as fotos e refletindo um pouco mais...É ainda mais claro o fato de que não posso reclamar de nada...Sou muito abençoada de ter sobrevivido e agora é viver a vida e deixar alguns detalhes para lá...








quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

7. Cuidados 24 horas por dia

* Sei que cada vez mais demoro para escrever novos posts aqui, e toda vez que tento bate uma preguiça, mas não aquela preguiça normal, e sim a falta de vontade de lembrar de momentos não muito bons... Todos os dias leio inúmeros blogs e fico culpada por não terminar ou atualizar o meu, especialmente por ser de um assunto tão específico, mas as vezes tenho a impressão de que estou escrevendo só para mim...O que não é verdade...Hoje quando verifiquei o número de acessos fiquei espantada...1.841 acessos causou uma certa empolgação dentro de mim... Então para você que sempre espera uma atualização (hello amigos) ou você que parou aqui por acaso, depois de ler, deixe um recadinho nos comentários, pode ser só um "oi", mas saber que alguém está se envolvendo na minha história faz a maior diferença e me dá forças para terminar essa parte da vida que apesar de triste, me trouxe muito ensinamentos e um final feliz!
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Estava pensando antes de começar a escrever e mais uma vez pare para pensar em como as coisas não são por acaso e como Deus faz acontecer tudo na hora e lugar certos, independente dos acontecimentos serem ruins ou bons.
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Durante o desenvolvimento da doença, eu fiquei internada em duas UTIs de dois hospitais diferentes, mas acho que se tivesse sido levada logo de cara para o segundo hospital, o trauma seria muito maior.
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Ser tratada no Hospital do Coração de Balneário Camboriú nos 3 primeiros dias me ajudou a manter a calma e acreditar que de alguma forma alguém ia descobrir o que eu tinha, pois eu tinha a impressão de que tudo estava voltado para mim. A UTI era pequena e as pessoas que trabalhavam lá foram maravilhosas. Éramos apenas 4 pacientes e somente um senhor que estava em coma e eu éramos considerados como delicados e graves. Dois outros pacientes que estavam lá estavam bem, e apesar de não ter visto o rosto deles, o que eu escutava fazia a diversão dos meus dias.
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A primeira noite foi bem difícil, mas não tão difícil quanto as outras que ainda estavam por vir. O fato de não conseguir fechar os olhos não era o pior, pois até então eu não sabia disso, apesar de ser, acho eu, uma das principais causas de não conseguir dormir bem e ter o sono muito mais leve do que o normal. Na verdade não posso dizer que dormi, pois minha cama ficava de frente para um relógio de parede e a cada vez que tentava dormir, assim que olhava denovo para o relógio só alguns minutos tinham se passado...
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Mas quando eu digo que estar lá, naquela UTI, fez a maior diferença, é porque a atenção que foi dada a mim ajudou muito. Os enfermeiros tanto do turno da noite quanto do dia não mediam esforços para me ajudar no momento em que eu chamava e não cansavam de repetir que tudo ia ficar bem.
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Na primeira noite os sintomas ainda não tinham evoluído totalmente, então ainda tinha força nos braços e nas mãos, o que facilitou muito e não dependia de enfermeiros para levantar o encosto da minha cama ou levantar o colchão na parte das pernas. A UTI era muito bem equipada e minha cama tinha controle eletrônico para regular a altura do colchão, então cada vez que me sentia cansada de ficar em uma posição ou começava a sentir dores, eu mesma controlava a altura que queria ficar. Durante a noite só precisava de ajuda para fazer xixi e tomar remédios para a dor. Até me virar de lado eu conseguia, pois tinha força nos braços e arranjei um modo de me virar agarrando as laterais da cama. Só não me sentia muito confortável, pois tinha a sonda no meu nariz, oxigênio também no nariz e soro na veia, além dos eletrodos para controlar meus batimentos cardíacos e cada vez que eles se deslocavam, o alarme tocava.
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A noite inteira foi assim, me virando de um lado para o outro, nada de dormir, enfermeiros checando se estava tudo bem comigo de meia em meia hora e muita dor no corpo, dor que as vezes era insuportável. 
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Mas pior do que tudo isso, é estar consciente o tempo todo, não conseguir dormir e ter um relógio de frente para sua cama...O tempo simplesmente não passava...Tudo que eu queria era que o próximo dia chegasse, assim teria visita dos meus pais, uma movimentação maior de pessoas na UTI, o que de certa forma me distraía e talvez alguma boa notícia do médico, o que não aconteceu.
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Graças a Deus aquela noite acabou e o novo turno de enfermeiros tinha chegado e a mesma história de sempre. Junto com o turno anterior, eles passavam de cama em cama para comentar o que tinha acontecido durante a noite, antes de ir embora. 
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Meu caso sempre era o mais intrigante. A paralisia aumentando, muitas dores no corpo, voz que sumia cada vez mais, metade do rosto paralisado e o que me restava de expressão facial, acho que era algo muito assustado...Mas nada que os enfermeiros não ajudassem a passar. Todos eram super jovens, usavam scrubs (aquele uniforme azul) e Crocs coloridas no pé. As meninas tinham o maior cuidado com meu corpo e o mesmo posso dizer dos meninos. A vergonha foi passando e já não me importava mais quem me ajudava com a comadre, para poder fazer xixi na cama.
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Uma coisa que acontece muito na UTI, e vou falar disso mais tarde também, são as conversas entre enfermeiros. O que é uma coisa normal, pois eles estão no seu local de trabalho, se vêem todos os dias e tem coisas para dividir uns com os outros. Então é mais ou menos assim: Enquanto eles estão te trocando, segurando a comadre para fazer xixi, mexendo nos equipamentos, eles estão conversando, pois na maioria das vezes dois enfermeiros estão cuidando de você e aí surgem os mais variados assuntos e você lá, igual a uma boneca, sendo virada para lá e para cá, enquanto eles falam sobre o estágio, salário, namorados. Mas a grande diferença lá, é que eles tentavam me colocar dentro do assunto também. Enquanto conversavam, sempre olhavam para mim e mesmo eu não conseguindo falar (não falava, mas meu cérebro funcionava que era uma beleza), eles contavam a história desde o começo, ou explicavam com mais detalhes para eu poder entender 100% do que estavam falando e achei isso muito legal da parte deles. 
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O que me chateava um pouco, na verdade, muito, era não conseguir falar ou responder as curiosidades que eles tinham sobre minha vida na Irlanda. Como todos sabiam meu histórico, eles queriam saber o que eu fazia aqui, que países eu conhecia, se já tinha visto isso ou aquilo e era sempre difícil para responder, ao mesmo tempo que queria muito, contar tudo, passar o tempo conversando. Um dos enfermeiros me contou que o melhor amigo morava em Dublin, falou o nome do café que ele trabalhava, me deu pontos de referência sobre a cidade e eu queria muito, muito mesmo conversar com ele, pois como o mundo é uma azeitona, tinha grandes possibilidades de talvez eu já ter cruzado com o amigo dele. Mas eu não conseguia responder, minha voz não saia, eu tinha que me esforçar muito para conseguir falar uma só frase e aquele dia eu quase chorei, pois não conseguia mais conversar e a partir daí eles pararam de me fazer perguntas, pois sabiam da dificuldade.
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Mas o que eu quero dizer com tudo isso, é que esse contato mais humanizado, de te tratarem com mais carinho, fez a maior diferença e tudo que eu queria era saber o nome deles e um dia ir lá agradecer pessoalmente por tudo que fizeram por mim. Os cuidados que tiveram 24 horas, a paciência...
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Paciência e muito cuidado tiveram as meninas que também trabalhavam lá. Quando amanheceu e o turno da manhã já estava em ação trabalhando a todo vapor eu fiquei até assustada quando chegaram perto da minha cama e começaram a puxar os biombos que separam uma cama da outra para perto da minha, fazendo um mini quarto. Era a hora do banho, coisa que eu já tinha até esquecido que existia. Aí você se pergunta, como é que vão me dar banho?
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É a parte mais desconfortável de todas, quando definitivamente você não é mais dono do seu corpo, deve esquecer todos os complexos, a vergonha e let it go... Até então eu não tinha me dado conta de que o colchão era de ar, como aquelas boias para deitar na piscina, até elas tirarem o lençol de baixo para começar o banho.
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Tudo era desconfortável. Eu nua, o frio, a janela trazendo toda a claridade do mundo no momento em que você mais quer se esconder, as dores...Tudo... Com um balde cheio de água morna e sabão, elas começaram a lavar o meu corpo. Esfregavam todas as parte e cada vez mais eu ficava envergonhada. Uma puxava o braço, a outra a perna e assim foram lavando tudo. Me viraram de lado e assim lavaram a parte de trás do meu corpo também. Depois de tudo lavado com água e sabão, com um pano úmido, começavam a tirar o excesso de espuma, já que não era possível enxaguar. Depois de tudo limpinho, elas me viraram de lado e assim enquanto uma me ajudava a manter o meu corpo bem no canto do colchão, a outra ia secando tudo. Depois de tudo seco, elas pediram para lavar o meu cabelo, pois já fazia 2 dias que não tomava banho e acredito que o cabelo não estava na melhor condição possível. O que eu também queria entender naquela altura, era como elas iam conseguir lavar todo aquele cabelo. Na época eu ainda tinha cabelo na altura da cintura e nada fácil de cuidar.
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Então mais uma vez com a ajuda delas, tentaram subir ao máximo o meu corpo para o topo da cama, abaixaram bem o encosto e deixaram todo o cabelo para fora. Com uma bacia elas molharam tudo e começaram a lavar. Como eu já estava seca e com uma toalha em cima do meu corpo, a parte da lavagem do cabelo foi um pouco mais prazerosa. Eu não estava com frio e sentir meu cabelo sendo lavado me dava um pouco mais de dignidade, fazia me sentir limpa cada vez mais. Demorou bastante para elas terminarem, mas conseguiram enxaguar com muitos litros de água, desembaraçar e fizeram uma trança lateral, para que fosse mais fácil manter os fios e que não me atrapalhasse quando fosse me movimentar. 
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Aos pouco fui entendendo como tudo acontecia ali, você sempre em cima da cama e tudo acontece. Elas te lavam ali, o seu banheiro é ali, elas trocam o lençol com você ali também, quase um malabarismo, mas no final tudo da certo.
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Eu fui a primeira do dia, e depois de pronta só escutava elas conversando durante o banho dos outros pacientes e assim minha manhã foi passando. Depois do banho, o café da manhã dos outros dois pacientes que estavam melhores, chegou. Me senti muito mal em ouvir o som dos talheres e eles comentarem sobre a comida. Apesar de não sentir fome, pois de qualquer forma estava sendo alimentada através da sonda nasal, a vontade de comer alguma coisa nunca passava. Sentir o gosto das coisas, mastigar, degustar, isso não tem preço, por isso não me privo mais de comer nada que tenho vontade, pois passei muita vontade durante muitos meses até me recuperar.
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Enquanto os outros tomavam café da manhã, um dos enfermeiros trocava o meu saquinho de comida que ficava pendurado do lado do meu soro. Ás vezes uma mistura marrom, que parecia uma papinha de bebê e outras um vidro com algo que parecia leite. 
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Depois do banho e do "café da manhã", visita do médico, que ainda não tinha nenhuma resposta sobre o meu tratamento ou diagnóstico definitivo sobre o que eu tinha. Sempre muito cuidadoso, me tratava com carinho e sempre muito otimista. Deixava sempre muito claro que estava correndo contra o tempo para poder me ajudar...
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As visitas do médico eram sempre muito rápidas, pois ele não trabalhava no hospital, e sempre passava por lá especialmente para ver como eu estava e para falar com meus pais.
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A melhor parte desse hospital eram as duas visitas por dia, assim meu dia se resumia em esperar a hora de ver meus pais e meu irmão. Quando chegou a hora de vê-los, era uma mistura de felicidade e dor ao mesmo tempo, pois eu sabia que estava piorando. E ver aquilo nos olhos das pessoas é bem difícil, por mais que todos tentem disfarçar. 
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Não lembro quem entrou primeiro, mas lembro bem do rosto do meu pai, da minha mãe e do meu desespero em falar com meu irmão. Meus pais chegaram com a notícia de que estavam tentando me transferir para uma outra cidade que fosse mais fácil de se hospedar e que tivesse mais estrutura caso algo mais grave acontecesse. Eles estavam tentando me levar para São Paulo ou Curitiba.  Eu acreditava que São Paulo era a melhor opção por pensar na maior quantidade de médicos especializados e por eu ter família lá. 
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Tentei explicar que estava tudo bem, que as dores estavam aumentando, mas que estava sendo bem cuidada. Eles me contavam sobre o que minha prima Ana estava fazendo, sobre meu irmão que queria que aquele pesadelo acabasse logo e sobre todos os contatos que estavam fazendo para conseguirem me transferir logo. 
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Quando meu irmão entrou, o que mais queria pedir era para que ele entrasse em contato com todo mundo que eu conhecia e que estavam me esperando no Brasil e contasse o que estava acontecendo. Que também conversasse com meus amigos da Irlanda, assim poderiam traduzir para o Pankaj, o que realmente estava acontecendo em tempo real.
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Foi muito legal da parte dos enfermeiros deixar sempre toda minha família entrar para me ver. Mas aquele sentimento de quando eles deixavam a UTI eu nunca vou esquecer. Teve uma vez que chorei muito, muito mesmo quando eles foram embora. Um dos enfermeiros veio me consolar e tentar me acalmar. Por mais que as pessoas tentem sorrir, te passar boas vibrações, o olhar nunca mente. Olhar de desespero, preocupação, de incapacidade ... E o fato de receber visitas deitada, isso é horrível. É como se as pessoas estivessem te velando, eu me sentia uma morta, sempre...
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Os meus dias de UTI em Santa Catarina foram sempre assim. Enfermeiros especiais que cuidaram de mim com muito carinho. Atenção 24 horas por dia e cuidado. Conforme a doença foi evoluindo, eu precisava cada vez mais de ajuda. Em 2 dias eu senti o meu braço enfraquecer muito, na verdade as mãos primeiro. Ainda conseguia me virar agarrando as grades da cama, pois me segurava com o braço toda vez que precisava, mas quando precisava elevar o encosto da cama ou a parte das pernas, os meus dedos não tinham mais forças para apertar os botões da cama. Eu precisava de ajuda ou ter muita paciência até conseguir. As pernas também foram enfraquecendo com o passar das horas, pois era cada  vez mas difícil fazer pequenos movimentos com os pés. Meus membros inferiores e superiores não estavam mais recebendo estímulos do cérebro, e a dor piorava cada vez mais...
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No terceiro dia, minha mãe chegou com a boa notícia, que ao mesmo tempo me deixou feliz e me aterrorizou. Eles tinham conseguido um hospital que aceitasse meu caso e que tinha vaga na UTI. Ia ser transferida para o Hospital Angelia Caron em Curitiba e a transferência ia acontecer assim que conseguissem uma UTI móvel para me levar. Estava feliz pois via isso como um sinal de esperança, mas com medo de deixar um lugar onde me sentia segura e bem cuidada. Mas fui em paz, pensando em encontrar em Curitiba uma UTI igual a que eu estava...Grande engano meu...

terça-feira, 12 de julho de 2011

6. UTI

Muita dor, muita dor eu senti naquela noite. Passei frio, passei calor e minha mãe só passou nervoso. Como ja disse anteriormente, nunca tinha ficado em hospital e muito menos minha mãe tinha visto um filho no hospital em situações como esta. Às vezes ficava pensando no que meu irmão estava fazendo, se estava na praia, se estava no apartamento, se alguém mais estava sofrendo. Pensava no meu pai, no que estava comendo, o que estavam fazendo o dia inteiro. Também tinha minha tia Sílvia e minha prima Ana que vieram de São Paulo para passar alguns dias com a gente em Santa Catarina. Será que eu tinha estragado as férias de todo mundo? Acho que sim...só da minha priminha que talvez não tivesse maturidade suficiente para entender o que estava acontecendo, mas sabia que a prima dela aqui estava internada no Hospital do Coração, tadinha...Essa informação ela guardou bem.
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Na manhã seguinte chegou a hora de ser transferida para a UTI. Hora de tirar brincos, correntes, anel e a minha pulseira indiana que nunca tirava para nada, desde que ganhei do Pankaj quando fomos para a Índia. Se me faltava um pouco de dignidade, o resto foi embora no momento que entrei na UTI. Momento em que você não é mais dono do seu corpo.
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Não me lembro muito bem do processo quarto-UTI, só tenho lembranças da UTI em si...Aliás, lembro de entrar, ainda deitada na maca, naquele ambiente extremamente branco e limpo, com poucas camas separadas por cortinas e muitos, muitos aparelhos médicos. Atravessamos toda a sala e me colocaram em uma cama bem no cantinho, ao lado da janela, onde poderia ter o máximo de claridade possível, quando as persianas estavam abertas.
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Da minha cama eu conseguia ver o balcão onde os enfermeiros ficavam preenchendo seus formulários e observando a gente. Bom, "a gente" era uma senhora que não vi o rosto, mas que pela voz era muito animada, um outro senhor que também falava alto e era um pouco mais rabugento e do meu lado direito, um homem que estava em coma e esporadicamente vomitava, não sei como, mas toda vez que isso acontecia era um caos. Eu ficava assustada, todo mundo ficava assustado e os enfermeiros corriam para fazer a sucção antes que ele pudesse aspirar o vômito e se afogar.
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Quando me colocaram na cama e pude olhar com calma a minha volta, percebi que os enfermeiros eram muito novos, muito mesmo, na faixa dos vinte e poucos anos, assim como a enfermeira chefe, que era nova também. Usavam uniforme azul, igual aos "scrubs" que via no Grey's Anatomy e todos calçavam Crocs roxos, acho que era para combinar com o azul dos scrubs, e ficava legal, dava um colorido naquele lugar.
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Um enfermeiro e uma enfermeira vieram cuidar de mim e preparar tudo. Esse "tudo" que eu nem fazia conta do que era! Prenderam meu cabelo, que ainda era comprido, comprido, até a cintura. Enxeram o meu peito de eletrodos e colocaram um aparelho no meu dedo indicador para medir meu batimento cardíaco. Tiraram a minha calcinha, guardaram para entregar para minha mãe e lá estava eu pronta para meus dias de solidão. Bom...foi o que eu achei, mas o pior estava por vir...duas coisas que jamais, JAMAIS vou esquecer: a primeira vez que tentei urinar na "comadre" (aquela bacia de ferro que colocam embaixo da gente quando nao podemos ir ao banheiro, exatamente por estar preso numa cama de hospital) e a sonda, bendita sonda para que eu pudesse me alimentar, já que todos os meus músculos estavam paralisados e consequentemente não conseguiria comer.
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Foi algo bem assustador. A enfermeira veio com mais de um metro de uma fina mangueira de plástico e começou a medir o comprimento colocando em cima de mim. Ela começou colocando a mangueira mais ou menos na altura do meu estômago e subia até o meu nariz, mas deixou um pouco mais. Aí chegou a hora que eu tanto temia. Na ponta da mangueira tinha uma peça de ferro, um pouco comprida, e que mais tarde descobri que era a parte que ficaria dentro de mim. E agora, por onde colocar a sonda nasogastrica, claro, como o próprio nome diz, pelo nariz. Acho que o meu olhar assustado e também certamente pela experiência que ela tinha em colocar aquela sonda em pacientes, ela chamou todos os meninos que estavam lá, para me acalmar e segurar minha cabeça.
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É uma dor insuportável mesmo! Lembro daquela ponta de ferro vindo em minha direção e a enfermeira, com toda força e cuidado para fazer o procedimento o mais rápido possível, colocou a sonda no meu nariz. E foi enfiando, enfiando, um metro de sonda! Acho que o momento que a sonda entra, a impressão que eu tinha era que meu rosto estava se partindo ao meio. Não só o rosto, mas todo o crânio. Um dor imensa e ao mesmo tempo escutava eles gritando "engole, engole, engole". Era para eu fazer o movimento de engolir, porque a sonda já estava na minha garganta, e fazendo isso, desceria mais fácil até o estômago. E lá se foi. Eu me tremia toda e chorava muito. Foi medo, dor, medo, dor...E depois daquilo, medo do que mais eu ia enfrentar naquele hospital e por quanto tempo...A partir daquele momento, por um mês não coloquei nada na boca. Não tomei água, não tomei sopa. Tinha um acompanhamento nutricional, mas era nojento ver a comida que eles me davam através da minha sonda. Um saquinho pendurado do lado do soro, no alto da minha cama, com um líquido marrom que entrava pelo meu nariz. Esse era meu almoço ou janta. E depois p limpar o caninho e não ficar com resquícios de comida, eles injetavam água até limpar tudo e voltar a ficar transparente.

Sonda nasogástrica

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Depois de todo o desespero de por a sonda, veio a vontade de fazer xixi. Ó vida! Chamei alguém e um dos meninos vieram me ajudar. Um menino, me ajudar, a fazer xixi na cama do hospital!!?? Acha que consegui? Claro que não! Primeiro foi um sufoco colocar a comadre embaixo de mim. Dois para me levantar e um para colocar a comadre o mais rápido possível. E sempre ficava desconfortável de primeira. Machucava e não me parecia o melhor lugar para fazer xixi. Ele falava que já estava acostumado, que era para eu relaxar, fingir que ele não estava ali, que não tinha nada demais, mas não dava. Nunca tinha feito xixi deitada, muito menos com gente do meu lado! Ele levantava a cama, levantava meu quadril, me cobria com lençol, afinal, estava tudo de fora né...Mas não rolava. Até que outra enfermeira veio e deu uma pressão, do tipo "se você não conseguir fazer, vamos ter que colocar outra sondinha para sua urina sair." Pensei com meus botões, se a sonda por cima foi aquele desespero, imagina por baixo! Não tinha nem idéia de como era essa sonda e não tenho até hoje, mas não queria colocar nenhum tubo dentro de mim denovo! Fiz força, me concentrei, fechei os olhos e NADA! Até que ela teve uma idéia, ligou a torneira que tinha perto da minha cama. A tática também não funcionou. Até que, quando menos esperava, ela veio e jogou um copinho de água fria em cima de mim, quero dizer, lá naquele lugar e acho que pelo susto, funcionou, fiz xixi para meu alívio e de todos os enfermeiros da UTI. Manhã difícil aquela!

UTI

Depois de toda essa maratona, o silêncio chegou. Meus pensamentos pareciam tsunamis na minha cabeça. Eram tantos que eu nem sentia sono. Tudo se misturava. O passado em Dublin, pensar que dias atrás estava andando na neve, pegando táxi para ir para alguma festa. Bebendo, dançando, me divertindo e o melhor de tudo, tinha voz para conversar e sorriso para transmitir alguma felicidade. Naquele momento eu não tinha nada. Não tinha voz para conversar ou chamar os enfermeiros. Tinha que esperar algum deles olhar para mim, assim levantava a minha mão e eles sabiam que eu precisava de alguma coisa. Também pensava no Pankaj, em como contar para ele tudo isso. Pensava em todos os amigos que eu tinha prometido dar notícias, assim que minhas férias com meus pais acabassem. O que mais doía era lembrar das pessoas que eu tinha deixado em Dublin. Todos achando que eu estava me divertindo e na verdade, estava correndo risco de morte em uma UTI no interior de Santa Catarina. Queria conversar logo com meu irmão e mandar ele correr para internet e avisar todo mundo!
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Não era bem risco de morte, daqueles em que o paciente está em uma situação bem crítica, como depois de algum acidente de carro. Mas me colocaram lá pelo risco de ter parada respiratória, e isso também pode matar. Imagina a cabeça de uma pessoa, se não fica a mil, quando está totalmente consciente, esperando o pior acontecer. Às vezes também pensava no que sentiria se a tal parada respiratória acontecesse. Se ia doer, se ficaria consciente, inconsciente. Se a intubação seria necessária...A gente sempre pensa no pior, por medo...
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E assim passei algumas horas. Pensando, pensando e pensando. O pior era que no meio da UTI tinha um pilar, com a pia e um na parede. Era um martírio ver aquele relógio a cada segundo. Na UTI não tem TV, não tem rádio, só tem gente passando mal e eu lá para assistir. A hora não passava e quando o sono batia eu não conseguia dormir. Quando achava que ia tirar uma sonequinha, mas era tão leve, que quando alguém passava do meu lado, eu já acordava. UTI não é um lugar quieto como eu pensava, tem muito barulho, muita movimentação, especialmente quando há muitos pacientes. Era tentar relaxar, que alguém falava mais alto, era troca de turno, hora de limpar o chão, hora de trocar minha fralda. Pois é, colocaram fralda...Eu deixava lá por segurança, até mesmo quando fui para casa, sei lá, tinha impressão de que alguma coisa ia vazar, mas nunca sujei uma, prefiria usar a comadre.
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No mesmo dia, recebi duas funcionárias do estado, para fazer coleta de uma espécime da membrana da garganta. Como era caso de segurança pública, aquilo foi feito o mais rápido possível para descartar ou tratar aquela hipótese. A coleta também é bem desconfortável. Com uma espécie de cotonete bem comprido, retiraram um pouco da membrana da minha gargante e do meu nariz. Foi rápido, mas a cada visita eu ficava mais nervosa e ansiosa. Eu queria saber logo o que estava acontecendo comigo. Queria um tratamento real!
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Mas a melhor hora do dia tinha chegado, às duas da tarde e a hora da visita. Um de cada vez, minha mãe entrou primeiro. Acho que era meio assustador olhar para mim. Já não estava mais na cama do quarto do hospital, estava na UTI e eu tenho um pouco de idéia de como as pessoas ficam, olhando p cama que estava ao meu lado. Eu agora tinha sonda no nariz, vários eletrodos saindo do meu peito, fios por cima de mim, e um tubo de oxigênio na outra entrada do nariz. Quando minha mãe me deixou, eu não era nem metade disso, só alguém sem forças.
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Tentei falar com minha mãe, na verdade, escutei mais do que falei, pois não conseguia falar de uma forma que as pessoas conseguissem me escutar. Ela falou sobre minha prima Ana, que perguntava de mim. Que estavam conversando para tentar uma transferência para outra cidade, talvez Londrina ou São Paulo, onde eles tinham lugar para ficar. Estavam meio atordoados, mas tentando resolver tudo. Eu sentia vontade de chorar quando via a minha família. Não era legal porque não queria mostrar nenhum tipo de sofrimento, mas ao mesmo tempo estava com medo e não queria estar ali. Quando ela saiu, eu chorei mais, como se eu fosse ver ela pela última vez. Foi tão duro ficar horas longe de pessoas conhecidas e quando finalmente eu poderia ver alguém, era só por alguns minutos.
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Logo depois, antes que pudesse engolir o choro, meu pai entrou. Foi também muito difícil ver ele. Como ninguém estava acostumado ainda com a situação paciente e pais de paciente, uma barreira ainda prevalecia e todo mundo fingia que estava tudo bem. O meu pai é mais curioso, então me fez perguntas sobre a cama, se eu estava confortável, como eu controlava a posição, como estava sendo tratada e também repetiu tudo de bom que minha mãe tinha falado, todo o conforto que eu precisava.
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Eu acho que só uma pessoa poderia entrar para me visitar, mas o meu irmão e minha tia também entraram. Me coração não aguentou mesmo. Eu queria falar, queria reclamar, queria contar o que eu estava sentindo. Além das dores que eu estava começando a sentir, eu não tinha como conversar com alguém, algum enfermeiro, e assim fazer passar o tempo. Depois do meu pai, meu irmão entrou e não conversamos muito. Ele me desejou boa sorte, falou que todos estavam torcendo e que a família da Natália, a namorada dele, também tinham me mandado forças. No fim ele me mostrou o escapulário que ele carregava no pescoço e disse que ia dar para mim, mas como eu não poderia usar no hospital, ele ia entregar para minha mãe, para me proteger. Chorei mais um pouco e assim foi minha última visita.
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Passei a tarde sozinha, entre uma hora e outra, um enfermeiro checava se estava tudo bem e assim as horas foram se passando, muito vagarosamente, mas foram. A noite chegou, novos enfermeiros chegaram para o turno noturno e com o prontuário na mão, passavam em todas as camas, escutando atenciosamente a explicação do turno anterior, sobre tudo o que tinha acontecido naquele dia. Quando chegaram na minha cama, é sempre aquela cara de choque. Todos achavam que era mesmo Guillain-Barré, mas não deixavam de ficar piedosos em ver alguém tão novo internado em uma UTI.
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As luzes se apagaram e chegou a hora de dormir...Ah como eu queria dormir...mas além das dores e do desconforto, o resto do meu rosto paralisou e eu  não piscava mais, muito menos fechava os olhos para tentar dormir...